A REFORMA TRIBUTÁRIA E AS MUDANÇAS NO ITCMD: ENTENDENDO AS NOVAS REGRAS E SEUS IMPACTOS

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A Reforma Tributária e as Mudanças no ITCMD: Entendendo as Novas Regras e Seus Impactos

Após anos de debates intensos e expectativas, a reforma tributária finalmente se tornou uma realidade com a promulgação da Emenda Constitucional nº 132/2023.

Essa reforma, ansiosamente aguardada tanto pelo mercado quanto pela população em geral, traz consigo um objetivo ambicioso: simplificar e otimizar o sistema tributário nacional, tradicionalmente complexo e burocrático.

Embora o foco principal da reforma esteja na tributação sobre o consumo, ela também trouxe mudanças significativas em outras áreas, como na tributação do patrimônio, com destaque para o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD).

O ITCMD e a Competência dos Estados

O ITCMD é um tributo de competência estadual, o que significa que cada estado e o Distrito Federal possuem autonomia para legislar sobre a sua incidência e normas adjacentes.

No entanto, desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, existem duas exceções importantes a essa regra: a incidência do ITCMD sobre doações ou heranças vindas do exterior só poderia ser regulamentada após a edição de uma lei complementar nacional.

Esse detalhe gerou um impasse, pois, até hoje, essa lei complementar nunca foi promulgada.

Em meio à ausência dessa regulamentação, alguns estados decidiram por conta própria instituir a cobrança do ITCMD em situações que envolviam elementos internacionais, como doadores residentes no exterior ou heranças de bens localizados fora do país.

Essa decisão, naturalmente, gerou forte resistência por parte dos contribuintes e abriu caminho para uma longa batalha jurídica.

O STF e a Repercussão Geral

A controvérsia chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF), que, em julgamento de Repercussão Geral (Tema nº 825 — RE nº 851.108/SP), confirmou que a cobrança do ITCMD nas situações mencionadas só seria válida após a edição de uma lei complementar nacional.

O STF foi além e, em diversas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) propostas pela Procuradoria-Geral da República, declarou a inconstitucionalidade de várias leis estaduais que previam a cobrança do ITCMD sobre transferências patrimoniais oriundas do exterior.

A EC 132/2023 e Suas Implicações

Diante desse cenário, a Emenda Constitucional nº 132/2023 foi promulgada no final de 2023, estabelecendo que, enquanto a tão esperada lei complementar não for publicada, os estados não estariam autorizados a instituir o ITCMD sobre doações e sucessões vindas do exterior.

Essa mudança representa uma tentativa de dar uma solução provisória para a lacuna deixada pela falta de regulamentação nacional, permitindo que os estados continuem a cobrar o tributo nessas situações.

No entanto, surge a pergunta: essa autorização constitucional é suficiente para legitimar as cobranças com base nas leis estaduais vigentes?

A resposta, no meu ponto de vista, é negativa.

A Constitucionalidade Superveniente

Apesar da alteração trazida pela EC 132/2023, os dispositivos das leis estaduais que previam a cobrança do ITCMD sobre doações e heranças com conexão internacional foram declarados inconstitucionais pelo STF.

Essas leis foram consideradas nulas por falta de fundamento jurídico, e o entendimento consolidado é de que uma norma declarada inconstitucional não pode ser “ressuscitada” por uma mudança posterior na Constituição.

Esse entendimento, conhecido como “fenômeno da constitucionalidade superveniente”, foi reafirmado pelo STF em diversos julgamentos. O mais notável foi o caso do artigo 3º, §1º, da Lei nº 9.718/1998, que tentou expandir a base de cálculo do PIS e da Cofins sem autorização constitucional. Mesmo após a promulgação da Emenda Constitucional nº 20/1998, que teria dado essa autorização, o STF manteve a inconstitucionalidade do dispositivo original.

O Caminho para a Regularização

Com base nesse entendimento, as leis estaduais que anteriormente previam a cobrança do ITCMD sobre doações e heranças do exterior não podem simplesmente voltar a vigorar com o advento da EC 132/2023.

Para que essa cobrança seja validada, é necessário que os estados editem novas leis, em conformidade com a nova norma constitucional. Apenas dessa forma, as exigências tributárias terão o respaldo legal necessário, respeitando os princípios da segurança jurídica e da legalidade tributária.

Conclusão

A reforma tributária de 2023 trouxe avanços importantes para a simplificação do sistema tributário brasileiro. No entanto, no que diz respeito ao ITCMD e à sua incidência sobre doações e heranças com elementos internacionais, ainda há um caminho a ser percorrido.

A autorização dada pela EC 132/2023 aos estados é um passo importante, mas não é suficiente para legitimar automaticamente as cobranças anteriormente previstas. O

 próximo desafio será a adequação das legislações estaduais à nova realidade constitucional, garantindo, assim, que as exigências fiscais sejam tanto legais quanto justas.

Acompanhar essas mudanças e entender suas implicações é fundamental para os contribuintes, que devem estar atentos às novas regras e às suas possíveis consequências.

Com a reforma tributária, o Brasil dá um passo importante rumo a um sistema mais eficiente, mas a transição exige atenção e cuidado para evitar equívocos que possam gerar insegurança jurídica.