DIRPF 2025 e Investimentos em Offshore: O Que o Contribuinte Precisa Saber Diante das Novas Regras

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Se você é pessoa física residente no Brasil e tem investimentos em offshores, 2025 não é um ano como os outros. Pela primeira vez, a sua declaração de Imposto de Renda será feita à luz das novas regras da Lei nº 14.754/23, que alterou profundamente a forma de tributação de controladas no exterior.

A intenção da lei é clara: aumentar a transparência fiscal e combater estruturas abusivas de planejamento tributário internacional. No entanto, na prática, o que temos hoje é um cenário de insegurança, falta de clareza e um programa de declaração que parece não ter acompanhado a velocidade das mudanças legais.

Neste artigo, vou te explicar o que mudou, o que está faltando, os riscos envolvidos e como você, contribuinte, pode se proteger.

O que mudou com a Lei 14.754/23?

Antes da nova legislação, os lucros obtidos por offshores (empresas no exterior controladas por brasileiros) só eram tributados quando efetivamente distribuídos, ou seja, quando retornavam ao Brasil como dividendos.

Com a Lei 14.754/23, isso muda.

Agora, os lucros de offshores passam a ser tributados automaticamente, mesmo que não sejam distribuídos, desde que:

  • A pessoa física detenha o controle da entidade no exterior;
  • A offshore esteja localizada em país com tributação favorecida ou regime fiscal privilegiado;
  • Os lucros sejam apurados de acordo com normas brasileiras de contabilidade.

A alíquota definida é de 15% sobre o lucro apurado, com possibilidade de compensar eventuais tributos pagos no exterior.

O que deveria ter sido ajustado na DIRPF 2025 — mas não foi?

Diante dessas mudanças, a expectativa dos contribuintes e dos profissionais da área era de que a Receita Federal lançasse um programa de declaração com fichas específicas para registrar:

  • Lucros apurados por controladas no exterior;
  • Prejuízos acumulados e sua compensação;
  • Natureza das receitas da offshore (ex: rendas tributadas no Brasil, rendas isentas, etc.);
  • Impostos pagos no exterior, por tipo e por país.

Mas o que se viu foi uma versão do programa bastante simplificada e falha. Apenas dois campos foram adicionados:

  1. Valor do lucro sujeito à alíquota de 15%;
  2. Impostos pagos pela offshore que podem ser deduzidos.

Todo o resto… ficou de fora.

E quais os problemas reais disso? Vamos aos exemplos.

Exemplo 1: Offshore com lucro isento no Brasil

Imagine uma empresa no exterior que, durante o ano, recebeu R$ 100 mil em royalties oriundos do Brasil, já tributados na fonte aqui. Esses valores não deveriam ser tributados novamente na DIRPF do controlador.

Mas como não existe campo para registrar a origem e a natureza dessa receita, o contribuinte pode acabar pagando imposto duas vezes — ou pior, ser autuado no futuro por “omissão”.

Exemplo 2: Offshore com prejuízo no ano

Vamos supor que sua offshore teve prejuízo de R$ 50 mil em 2024.

Você pensa: “Sem lucro, sem imposto, certo?”

Tecnicamente, sim. Mas o programa não possui campo para informar o prejuízo, tampouco para demonstrar a compensação futura. Resultado?

  • O contribuinte não consegue justificar a ausência de imposto a pagar;
  • Corre risco de cair na malha fina ou ser alvo de autuação.

Faltam orientações oficiais da Receita Federal

Além das falhas no programa, outro fator agrava o cenário: a Receita ainda não publicou o manual com instruções detalhadas para a declaração de rendimentos em offshores com base na nova lei.

Esse manual sempre foi fundamental para esclarecer pontos técnicos e orientar o preenchimento correto da DIRPF. Sem ele, até mesmo advogados tributaristas e contadores ficam no escuro. E quem declara por conta própria, sem ajuda especializada, está ainda mais exposto a erros.

Por que tudo isso aconteceu?

Alguns fatores são citados nos bastidores:

  • A Lei 14.754/23 foi aprovada tardiamente, deixando pouco tempo para a Receita adaptar seu sistema;
  • Houve greve de auditores fiscais, o que impactou o cronograma de desenvolvimento do programa;
  • A complexidade das mudanças exigiria mais tempo e recursos do que os disponíveis no momento.

O resultado é um sistema que, ao que tudo indica, foi lançado de forma provisória, apenas para cumprir formalmente os prazos legais — mas que não dá conta da realidade trazida pela nova legislação.

O que fazer, então?

A recomendação é clara: atenção redobrada, cautela e documentação.

✔️ Guarde todos os demonstrativos financeiros da sua offshore;
✔️ Documente a origem das receitas e os tributos pagos no exterior;
✔️ Faça memória de cálculo detalhada, mesmo que o programa não exija;
✔️ Se tiver prejuízo, registre esse fato com base em laudo contábil ou declaração complementar, caso necessário.

E, acima de tudo, consulte um profissional especializado em tributação internacional.

Conclusão: transparência exige estrutura

Ninguém é contra a transparência fiscal. Muito pelo contrário: ela é necessária, principalmente em um mundo onde o capital circula com cada vez mais liberdade.

O problema é quando as leis mudam, mas os sistemas e as instruções ficam para trás.

Em vez de facilitar o cumprimento voluntário das obrigações, o contribuinte é lançado num ambiente de incertezas, com alto risco de erro, autuação ou até pagamento indevido.

É urgente que a Receita Federal atualize o programa, publique as instruções técnicas e assegure que o sistema esteja à altura da complexidade legal que ele próprio exige.

Até lá, todo cuidado é pouco.