BASE DE CÁLCULO NA CESSÃO DE COTAS DE UMA HOLDING FAMILIAR: VALOR DE MERCADO X VALOR PATRIMONIAL LÍQUIDO

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Base de Cálculo na Cessão de Cotas de uma Holding Familiar: Valor de Mercado x Valor Patrimonial Líquido

O planejamento sucessório por meio de uma holding familiar tem se tornado cada vez mais comum, especialmente para a gestão patrimonial e a facilitação da transmissão de bens entre gerações.

No entanto, surgem dúvidas em relação à tributação incidente nessa transmissão, em particular no cálculo do ITCMD (Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação).

Um ponto fundamental dessa discussão é a divergência entre o valor de mercado e o valor patrimonial líquido das cotas sociais da holding familiar.

O Cenário Atual da Tributação

Com a Constituição de 1988, houve uma mudança significativa na tributação das transmissões de bens e direitos. Ela passou a prever a incidência do ITCMD sobre quaisquer transmissões, seja por doação ou causa mortis. Isso inclui, por exemplo, a doação de cotas de uma holding familiar.

No cenário atual, tanto na sucessão quanto na doação de cotas, o cálculo do ITCMD pode variar consideravelmente. A questão central está na definição da base de cálculo: deve ser o valor de mercado das cotas ou o valor patrimonial líquido da empresa apurado em seu balanço contábil?

Divergências na Definição da Base de Cálculo

Há uma clara divergência entre o entendimento dos fiscos estaduais e o dos contribuintes. De um lado, os fiscos estaduais, como o de São Paulo, interpretam a Constituição e o Código Tributário Nacional (CTN) como fundamentação para a aplicação do valor de mercado das cotas como base de cálculo do ITCMD. Para eles, o valor de mercado reflete com mais precisão o real valor dos bens transmitidos, especialmente quando a holding familiar possui ativos significativos.

Por outro lado, os contribuintes defendem que a base de cálculo deve ser o valor patrimonial líquido das cotas, isto é, a diferença entre o ativo e o passivo da holding familiar apurada no balanço contábil. Eles argumentam que o valor patrimonial é uma medida mais objetiva e estável, uma vez que cotas de uma holding familiar geralmente não são negociadas no mercado, tornando difícil a fixação de um valor de mercado preciso.

A Lei e a Posição do Fisco Paulista

No Estado de São Paulo, a Lei nº 10.705/2000, que regula o ITCMD, define em seu artigo 9º que a base de cálculo do imposto é o “valor venal do bem ou direito transmitido”, considerando-se o valor de mercado na data da sucessão ou doação. Esse entendimento pode ser interpretado como uma preferência pelo valor de mercado, mas, em situações onde não há um valor de mercado claramente estabelecido, outras regras devem ser aplicadas.

O artigo 14 da mesma lei, por exemplo, admite que, na ausência de negociação recente de cotas sociais, o valor patrimonial deve ser utilizado como base de cálculo. Esse cenário é comum em holdings familiares, cujas cotas não são negociadas no mercado, reforçando a tese de que o valor patrimonial é o parâmetro mais adequado para o cálculo do ITCMD.

Valor de Mercado x Valor Patrimonial

A principal diferença entre o valor de mercado e o valor patrimonial líquido está na forma como eles são apurados:

  • Valor de Mercado: Representa o preço que as cotas alcançariam se fossem vendidas no mercado. No caso de holdings familiares, esse valor pode ser altamente especulativo, especialmente se a holding possuir ativos valiosos ou passivos significativos.
  • Valor Patrimonial Líquido: É a diferença entre o ativo e o passivo da empresa, calculado com base no balanço contábil. Esse valor é mais objetivo, pois reflete a situação financeira real da holding, e não está sujeito às oscilações do mercado.

Decisões Judiciais

Recentemente, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo tem se posicionado de forma favorável ao uso do valor patrimonial líquido como base de cálculo na transmissão de cotas de holdings familiares. Em processos como os de nº 1000481-49.2023.8.26.0483 e nº 10055713-45.2023.8.26.0482, o tribunal reconheceu que, em casos onde as cotas não são negociadas, o valor patrimonial é o mais adequado para apuração da base de cálculo do ITCMD.

Conclusão

A cessão de cotas de uma holding familiar gera uma importante discussão sobre a base de cálculo do ITCMD. Enquanto o fisco tende a adotar o valor de mercado, muitos contribuintes defendem que o valor patrimonial líquido é mais apropriado, dado o caráter estável e objetivo desse cálculo. No contexto de holdings familiares, onde as cotas não são negociadas em bolsa, a tendência atual é que o valor patrimonial seja amplamente aceito como base de cálculo, proporcionando maior segurança jurídica aos contribuintes. A correta apuração desse valor, baseada no balanço contábil da empresa, pode evitar futuras discussões com o fisco e garantir uma transmissão de bens mais eficiente.