Redução de Tributos na Importação de Serviços: A Vitória do Valor Aduaneiro sobre o Abuso Fiscal
Durante muito tempo, empresas brasileiras que contratavam serviços do exterior conviveram com uma amarga surpresa: o valor efetivamente pago ao prestador internacional era inflado artificialmente para fins de tributação, graças à inclusão do ISS e das próprias contribuições do PIS e da Cofins na base de cálculo dessas mesmas contribuições. Uma lógica que desafia a razão — e a Constituição.
A base jurídica para essa cobrança nasceu com a Lei 10.865/2004, que instituiu o PIS e a Cofins sobre a importação de bens e serviços. No seu art. 7º, inciso II, a legislação determinava que, para a importação de serviços, o contribuinte deveria calcular as contribuições sobre o valor total “pago, creditado, entregue, empregado ou remetido para o exterior”, acrescido do ISS e das próprias contribuições.
Ou seja, o tributo era calculado não apenas sobre o valor do serviço importado, mas também sobre outros tributos que sequer integravam a essência da operação. A conta se tornou, literalmente, um tributo sobre o tributo — o que já seria temerário. Mas, no caso, trata-se de flagrante inconstitucionalidade.
O Conceito de Valor Aduaneiro: O que a Constituição Determina
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 149, § 2º, III, “a”, foi clara ao definir que as contribuições incidentes na importação devem ter como base de cálculo o valor aduaneiro, conceito esse que está longe de ser aberto à interpretação arbitrária do legislador.
Esse “valor aduaneiro” é um termo técnico, definido pelo Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT) de 1994, ao qual o Brasil aderiu por meio do Decreto 1.355/94, e corresponde ao valor da transação, ou seja, o preço efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias ou serviços, ajustado apenas nos termos do próprio Acordo.
O STF já reconheceu expressamente, no julgamento do RE 559.937/RS, com repercussão geral, que não podem ser incluídos tributos como ICMS, PIS e Cofins na base de cálculo do PIS/Cofins-importação. Por analogia, e diante da identidade de fundamentos, esse entendimento foi estendido ao caso da importação de serviços, excluindo-se o ISS e as próprias contribuições da base de cálculo.
A Virada Jurisprudencial e a Conformidade Constitucional
Não se trata de mera esperança dos contribuintes. O entendimento do STF tem sido reiteradamente acolhido pelas instâncias inferiores. O TRF da 3ª Região, no Recurso de Apelação 5004972-33.2023.4.03.6100, reconheceu a inconstitucionalidade da inclusão do ISS e das próprias contribuições na base do PIS/Cofins-importação de serviços, alinhando-se à Constituição e ao GATT.
De forma ainda mais contundente, a própria Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), por meio do Parecer SEI 4891/22/ME, reconheceu a ilegalidade da prática e dispensou a apresentação de contestação e recursos em ações que discutem o tema. Em outras palavras, o próprio órgão que defende os interesses da União admitiu que não há razão jurídica para manter essa cobrança.
O Que Isso Significa para as Empresas?
Significa oportunidade. Significa direito à restituição de valores indevidamente pagos. Significa que o planejamento tributário eficiente — feito dentro dos parâmetros legais e constitucionais — pode representar economias reais e relevantes para empresas que contratam serviços do exterior.
A redução de tributos na importação de serviços é, portanto, mais do que uma tese jurídica: é um movimento legítimo em defesa do respeito à Constituição, à legalidade e à segurança jurídica. E uma forma de resistir ao constante apetite fiscal que insiste em tributar o que não deve ser tributado.
Conclusão: A Lógica do Limite
A Constituição já disse o que deve ser respeitado: valor aduaneiro. Nada mais. A insistência do Fisco em inflar essa base de cálculo é uma tentativa de romper os limites do razoável. Mas o Poder Judiciário, felizmente, tem restabelecido a ordem.
Neste cenário, empresas que importam serviços devem agir com estratégia: revisar seus recolhimentos, entrar com ações para recuperar valores pagos indevidamente e planejar futuras operações com base em segurança jurídica real.
Porque reduzir tributos, quando se faz justiça fiscal, não é privilégio — é direito.