Entre a Esperança e a Controvérsia: O Impacto da Revogação dos Incentivos Fiscais do Perse
Em meio à crise econômica global desencadeada pela pandemia da Covid-19, governos ao redor do mundo se viram compelidos a adotar medidas extraordinárias para amortecer o impacto devastador sobre diversos setores da economia. No Brasil, uma das iniciativas mais notáveis foi a implementação do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), cujo objetivo primordial era oferecer um alívio fiscal significativo às empresas do setor de eventos, uma das áreas mais severamente afetadas pelas restrições sanitárias impostas para conter a disseminação do vírus.
A essência do Perse residia na concessão de incentivos fiscais, como a redução a zero das alíquotas de PIS/Pasep, Cofins, CSLL, e IRPJ por um período de 60 meses.
Esta medida visava não somente assegurar a sobrevivência imediata de inúmeras empresas, mas também pavimentar o caminho para uma recuperação sustentável do setor a longo prazo.
Contudo, a recente revogação desses benefícios fiscais pelo governo federal gerou diversas controvérsias e incertezas, desencadeando amplos debates judiciais acerca da legalidade e da justiça dessa medida.
A controvérsia gira em torno da Medida Provisória nº 1.202/2023, que antecipa o término dos benefícios previstos pelo Perse, marcando o fim da alíquota zero para PIS, Cofins, e CSLL já a partir de 1º de abril de 2024, e do IRPJ, a partir de 1º de janeiro de 2025.
Esta Medida Provisória levantou questionamentos profundos sobre a natureza da isenção condicionada, um princípio fundamental no direito tributário brasileiro, enfatizado pela Súmula 544 do Supremo Tribunal Federal (STF), que estabelece que isenções tributárias concedidas sob condição onerosa não podem ser arbitrariamente revogadas.
O princípio da segurança jurídica, pedra angular do sistema jurídico brasileiro, especialmente no que tange ao direito tributário, é violado quando o governo altera unilateralmente as regras fiscais estabelecidas, sem observar os prazos e as condições previamente acordados.
A doutrina e a jurisprudência brasileiras, incluindo decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), têm reiteradamente defendido a inviolabilidade das isenções fiscais concedidas por prazo determinado, sob o amparo desse princípio.
Especialistas como Regina Helena Costa e Aliomar Baleeiro têm sido vocais em suas críticas a tais revogações antecipadas, argumentando que elas representam uma afronta direta ao direito adquirido e à segurança jurídica, comprometendo a confiança dos contribuintes nas políticas fiscais do governo.
A proteção da confiança, conforme enfatizado em decisões do STJ, é uma manifestação do princípio da segurança jurídica, merecedora de reconhecimento e respeito nas deliberações judiciais.
A revogação dos benefícios fiscais do Perse, portanto, não apenas desconsidera o direito adquirido das empresas que neles confiaram, como também põe em xeque a própria noção de segurança jurídica no Brasil.
Em tempos de crise, a estabilidade e previsibilidade das políticas fiscais são fundamentais para a manutenção da confiança entre o setor privado e o governo, sendo essenciais para a recuperação econômica do país.
O debate em torno da revogação dos incentivos fiscais do Perse transcende a esfera legal, tocando em questões fundamentais sobre a relação entre o Estado e o setor privado em momentos de adversidade.
Respeitar o princípio da segurança jurídica é imperativo, não apenas para assegurar a confiança dos contribuintes nas políticas fiscais estabelecidas, mas também para garantir a estabilidade necessária para a recuperação econômica pós-pandêmica.
Nesse contexto, o caso do Perse emerge como um lembrete fundamental da importância de manter a integridade e a previsibilidade das políticas governamentais, especialmente em tempos de incerteza e desafio.