DESPERSONALIZAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA

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DESPERSONALIZAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA

A desconsideração da personalidade jurídica é um conceito jurídico de extrema importância e sua compreensão é fundamental para empresários, consumidores, e a sociedade em geral. Este artigo pretende explicar, de forma simples e acessível, o que significa esse conceito, como ele surgiu, e como é aplicado no Brasil.

O que é a Personalidade Jurídica?

Para entender a desconsideração da personalidade jurídica, primeiro precisamos saber o que é a “personalidade jurídica”. Em termos simples, é a capacidade reconhecida pela lei de uma entidade (como uma empresa) ter direitos e obrigações.

Quando uma empresa é criada, ela ganha uma identidade própria, distinta dos seus sócios ou proprietários. Isso significa que as dívidas da empresa não são automaticamente as dívidas dos sócios, e vice-versa.

Origem do Conceito de Desconsideração da Personalidade Jurídica

O conceito de desconsideração da personalidade jurídica surgiu na Alemanha, proposto pelo jurista Rolf Serick em meados dos anos 1950. Serick defendia que, em certos casos, os credores deveriam ter o direito de ultrapassar essa separação entre a empresa e seus sócios para receber o que lhes é devido.

No Brasil, a desconsideração da personalidade jurídica foi introduzida na doutrina jurídica pelo doutrinador Rubens Requião na década de 1960. A ideia só foi transformada em lei muitos anos depois, com o Novo Código de Processo Civil (CPC) em 2015. A

A desconsideração da personalidade jurídica é regulamentada principalmente pelos artigos 133 a 137 do CPC e se relaciona com outros diplomas legais, como o CTN, a Lei de Infrações da Ordem Econômica, o CDC e, mais recentemente, a Lei da Liberdade Econômica.

Como Funciona a Desconsideração da Personalidade Jurídica

A desconsideração ocorre quando a justiça permite que os credores cobrem diretamente dos sócios ou administradores da empresa, em vez de se limitar ao patrimônio empresarial. Isso acontece em situações onde a empresa é usada de forma abusiva, para fraudar credores ou para cometer irregularidades.

Existem, basicamente, dois critérios que podem levar à desconsideração da personalidade jurídica:

  • Teoria Maior: É a mais comum e está baseada no Código Civil. Para que a justiça desconsidere a personalidade jurídica por essa teoria, é necessário comprovar que houve “abuso da personalidade jurídica”, seja por desvio de finalidade (quando a empresa é usada para fins diferentes dos que foram declarados ao ser criada) ou por confusão patrimonial (quando não é possível distinguir o que é patrimônio da empresa e o que é dos sócios).
  • Teoria Menor: Menos comum e mais restrita, aplicada principalmente em relações de consumo e direito ambiental. Aqui, basta demonstrar que a empresa não tem condições de pagar suas dívidas para que a responsabilidade passe para os sócios.

A discussão entre essas teorias reflete a tensão entre proteger os credores e ao mesmo tempo salvaguardar a autonomia patrimonial da empresa. Enquanto o Código Civil e o sistema judiciário tendem a proteger o devedor, o CDC apresenta uma postura mais pró-credor, evidenciando o caráter protetivo do direito do consumidor.

Aplicação da Desconsideração da Personalidade Jurídica

A aplicação da desconsideração da personalidade jurídica pode acontecer em qualquer fase do processo judicial. No entanto, essa possibilidade não é uma carta branca para punir os sócios por qualquer dívida da empresa. A justiça brasileira exige que se prove o uso indevido da empresa para que os sócios sejam responsabilizados pessoalmente.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ), a mais alta instância da justiça brasileira para casos não constitucionais, já se manifestou diversas vezes sobre o assunto. De acordo com o STJ, uma vez comprovado o abuso, não se discute mais se os sócios devem ou não ser responsabilizados, eles serão, independentemente da quota de cada um no negócio.

A Teoria Inversa da Desconsideração da Personalidade Jurídica

Além da desconsideração tradicional, existe a “desconsideração inversa”. Neste caso, se um sócio esconde seu patrimônio pessoal investindo em uma empresa, a justiça pode permitir que as dívidas pessoais desse sócio sejam pagas com o patrimônio da empresa. Isso ajuda a prevenir que pessoas usem entidades corporativas para fugir de suas responsabilidades financeiras.

Conclusão

A desconsideração da personalidade jurídica é um instrumento jurídico que traz justiça e equidade para as relações comerciais e de consumo. Ao mesmo tempo que protege os sócios de serem automaticamente responsabilizados por dívidas das empresas, também impede que se cometam abusos sob a proteção dessa separação.

Esse equilíbrio entre proteção e responsabilidade é essencial para a confiança nas transações comerciais e a estabilidade do sistema jurídico. O entendimento e a aplicação correta desse conceito é um reflexo da maturidade e da complexidade do direito brasileiro, que continua a evoluir e a se adaptar às necessidades de uma sociedade cada vez mais dinâmica e interconectada.