TRANSFERÊNCIA DE MERCADORIAS E O ICMS: NÃO TRANSFERÊNCIA DE CRÉDITOS NAS OPERAÇÕES INTERESTADUAIS

Compartilhar
Facebook
LinkedIn
WhatsApp
Email
Sacada Tributária

Transferência de Mercadorias e o ICMS: Não Transferência de Créditos nas Operações Interestaduais

A tributação sobre a circulação de mercadorias, particularmente o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), sempre representou um terreno fértil para disputas jurídicas no Brasil.

Recentemente, uma significativa evolução jurisprudencial trouxe luz a um tema debatido há tempos: a incidência do ICMS na transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular.

Este artigo visa elucidar essa trajetória, suas implicações práticas para os contribuintes e as recentes decisões judiciais que moldam o panorama atual da tributação sobre o ICMS em operações de transferência interna.

O Supremo Tribunal Federal (STF), por meio da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 49 e do julgamento do recurso com repercussão geral reconhecida (Tema 1099), juntamente com decisões correlatas do Superior Tribunal de Justiça (STJ), assentou o entendimento de que a transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular não constitui fato gerador do ICMS, por se tratar apenas de um deslocamento físico dos bens.

A ratificação deste entendimento pelo STF veio com a declaração de inconstitucionalidade de dispositivo da Lei Kandir (Lei Complementar 87/1996), que permitia a cobrança do ICMS nesta modalidade de transferência.

A decisão, eficaz a partir de 2024, representou uma vitória para os contribuintes, que há muito contestavam a tributação nestas operações.

A Resposta do CONFAZ e as Normativas Estaduais

Em resposta à decisão do STF, o Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ) celebrou o Convênio ICMS nº 178, em 1º de dezembro de 2023.

Com base nesta normativa, posteriormente foi implementado no Estado de São Paulo pelo Decreto nº 68.243, de 22 de dezembro de 2023.

Este convênio, ainda que reconheça a não incidência do ICMS sobre a transferência de mercadorias, introduziu a obrigatoriedade de transferência do crédito de ICMS inicialmente apropriado pelo estabelecimento remetente para o destinatário, nas operações interestaduais.

Este mecanismo busca preservar a não-cumulatividade do imposto, garantindo que o crédito do ICMS continue a fluir ao longo da cadeia de operações.

Controvérsias e Reações dos Contribuintes

Apesar das intenções do CONFAZ e do Estado de São Paulo em regularizar a transferência de créditos de ICMS conforme o novo entendimento jurídico, muitos contribuintes se sentiram prejudicados.

Argumentam que a obrigação de transferir os créditos não foi o que o STF decidiu. Segundo eles, o STF assegurou ao contribuinte o direito de manter os créditos do ICMS nas operações anteriores, configurando uma faculdade e não uma obrigação.

A Lei Complementar nº 204, de 28 de dezembro de 2023, e as regulamentações subsequentes são vistas por muitos como um desvio da decisão original do STF, impondo restrições não previstas pelo tribunal.

Consequentemente, diversos mandados de segurança foram impetrados, questionando a obrigatoriedade da transferência de créditos de ICMS, sustentando que tal exigência contraria tanto a jurisprudência do STF quanto o princípio da não-cumulatividade.

Decisões Judiciais Recentes e o Futuro da Tributação sobre o ICMS

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), ao apreciar casos relacionados, tem emitido decisões que favorecem os contribuintes, assegurando o direito à apropriação facultativa dos créditos de ICMS em operações de transferência interna.

Tais decisões reforçam o entendimento de que as normas estabelecidas pelo CONFAZ, e internalizadas pelo Estado de São Paulo, devem respeitar a liberdade do contribuinte em gerir seus créditos de ICMS, conforme delineado pelo STF.

Conclusão

A saga jurídica em torno da incidência do ICMS sobre as transferências de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular ilustra a complexidade do sistema tributário brasileiro e a constante busca por equilíbrio entre a necessidade de arrecadação fiscal e os direitos dos contribuintes.

Enquanto o caminho para uma clareza definitiva ainda é trilhado, as recentes decisões judiciais representam passos importantes na direção de uma maior previsibilidade e justiça fiscal para os contribuintes brasileiros.